Porque o caminho da tarde é sereno: desliza úmido. E afoga meus valores, meus preceitos, minhas vontades: a tarde se torna viva para o nada e para o nada ela dança, dança feito bailarina em chamas. Não penso mais. Não hoje… Hoje eu deixo que ela tome minha mão – amante querida – e me leve aos escorregões do desejo que se impõe. Que me convida e me derruba. Como se fosse desejo de. Mas não é. É mais fluido que isso. É mais forte que isso. É abertamente delicado no íntimo das coisas que respiram. A tarde respira quente, sopra seu inferno aqui. Aqui, ali, onde for: a tarde tem nome feminino mas não tem gênero. É ele e ela: é nós. A tarde tem um nome que desata os nós, porque seu nome rasga. Nome que se assemelha ao meu por causa da letra R que perfura a coisa inteira. Desintegra. Desfaz. Faz tudo em poros atravessáveis. Hoje, da tarde de que sou feita, sou atravessada por inverdades múltiplas que vem contar seus planos. Então, agulha fina me tece novamente. Porque aos poucos a noite chega. Exigente. Também tem nome feminino. Também é líquida. Mas vem para silenciar, toda intimista. A noite – tantos temem! Mas é muito, muito mais gentil. É linha reta que estanca a ansiedade.
por Carla Jaia
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