Ninguém merece ser estuprado!


"Oi, meu nome é Fernanda (nome fictício).

Estou aqui para contar a minha triste experiência que um monstro me fez viver quando eu ainda era uma criança.

Eu tinha uns 6 anos mais ou menos, morava numa cidade bem pequena no nordeste, lá era um lugar onde as condições de vida eram precárias, muito difícil de arrumar emprego, e quando arrumava era pra ganhar bem pouco, meu pai trabalhava lá mas o que ganhava mal dava para a comida, o que dirá para comprar brinquedos para os filhos, eu tinha mas eram bem pouco e bem simples também, mas eu tinha muitos amiguinhos que tinham ótimos brinquedos e que sempre me chamavam para brincar, um deles morava na frente da minha casa, era sobrinho de um amigo de longa data do meu pai, e eu sempre ia a casa dele para brincar.
Certo dia esse amigo do meu pai foi me buscar para brincar com o sobrinho dele, meus pais deixaram e eu fui. 
Chegando lá, não tinha ninguém em casa, porem ele me deixou ficar sentada num quartinho rodeada de brinquedos. Ele ficou sentado do meu lado, faz muito tempo, não me lembro ao certo o que ele fazia, mas lembro que ele introduzia o dedo em mim.
No começo fiquei assustada, mas ele disse que não estava fazendo nada de mais, que era pra eu continuar brincando. Isso aconteceu umas três vezes até eu comentar com a minha mãe. 
Pelo obvio, nunca mais fui brincar na casa dele, eles pararam de se falar, mas meus pais não o denunciaram, não sei o motivo, talvez por falta de instrução. 
Mais pra frente vivenciei algo parecido, mas dessa vez não foi comigo. 
Meu irmão sempre me levava para a escola, e em um certo dia quando ele estava voltando para casa ele foi pego por um homem que rasgou toda a roupa dele, o beijou e estava tentando concretizar o ato do estupro, meu irmão foi até a casa de um amigo que morava próximo para poder se vestir, logo a cidade toda ficou sabendo. 
Meus pais dessa vez foram á delegacia e o denunciaram, mas os pais do tal individuo levaram um laudo médico onde comprovava que ele tinha distúrbios mentais, no fim das contas nada aconteceu com ele.
Já na minha família ficou um trauma, esse assunto sempre foi muito delicado dentro de casa, mas hoje com o resultado dessa pesquisa onde as pessoas afirmam que a principal causa dos estupros são as roupas provocantes que as mulheres vestem, não pude me calar. Fico pensando, com 6 anos que tipo de coisa eu fazia para causar desejo ou provocar esse homem? E o meu irmão, o que ele fazia ao andar á caminho de casa? 
Nada justifica um ato desses.
Eu não merecia ser estuprada, meu irmão não merecia ser estuprado. Ninguém merece."

                 

Então, quem já foi ou quase, e quiser relatar, pode o fazer pelo ask da BSPM (http://ask.fm/BSPMeninas) com a certeza que seu nome não será exposto. 



Um comentário:

  1. Hoje fui estuprada. Subiram em cima de mim, invadiram meu corpo e eu não pude fazer nada. Você não vai querer saber dos detalhes. Eu não quero lembrar dos detalhes. Ele parecia estar gostando e foi até o fim. Não precisou apontar uma arma para a minha cabeça. Eu já estava apavorada. Não precisou me esfolar ou esmurrar. A violência me atingiu por dentro.

    A calcinha, em frangalhos no chão, só não ficou mais arrasada do que eu. Depois que ele terminou e foi embora, fiquei alguns minutos com a cara no chão, tentando me lembrar do rosto do agressor. Eu não sei o seu nome, não sei o que faz da vida. Mas eu sei quem me estuprou.

    Quem me estuprou foi a pessoa que disse que quando uma mulher diz “não”, na verdade, está querendo dizer “sim”. Não porque esse sujeito, só por dizer isso, seja um estuprador em potencial. Não. Mas porque é esse tipo de pessoa que valida e reforça a ação do cara que abusou do meu corpo.

    Então, quem me estuprou também foi o cara que assoviou para mim na rua. Aquele, que mesmo não me conhecendo, achava que tinha o direito de invadir o meu espaço. Quem me estuprou foi quem achou que, se eu estava sozinha na rua, na balada ou em qualquer outro lugar do planeta, é porque eu estava à disposição.

    Quem me estuprou foram aqueles que passaram a acreditar que toda mulher, no fundo no fundo, alimenta a fantasia de ser estuprada. Foram aqueles que aprenderam com os filmes pornô que o sexo dá mais tesão quando é degradante pra mulher. Quando ela está claramente sofrendo e sendo humilhada. Quando é feito à força.

    Quem me estuprou foi o cara que disse que alguns estupradores merecem um abraço. Foi o comediante que fez graça com mulheres sendo assediadas no transporte público. Foi todo mundo que riu dessa piada. Foi todo mundo que defendeu o direito de fazer piadas sobre esse momento de puro horror.

    Quem me estuprou foram as propagandas que disseram que é ok uma mulher ser agarrada e ter a roupa arrancada sem o consentimento dela. Quem me estuprou foram as propagandas que repetidas vezes insinuaram que mulher é mercadoria. Que pode ser consumida e abusada. Que existe somente para satisfazer o apetite sexual do público-alvo.

    Quem me estuprou foi o padre que disse que, se isso aconteceu, foi porque eu consenti. Foi também o padre que disse que um estuprador até pode ser perdoado, mas uma mulher que aborta não. Quem me estuprou foi a igreja, que durante séculos se empenhou a me reduzir, a me submeter, a me calar.

    Quem me estuprou foram aquelas pessoas que, mesmo depois do ocorrido, insistem que a culpada sou eu. Que eu pedi para isso acontecer. Que eu estava querendo. Que minha roupa era curta demais. Que eu bebi demais. Que eu sou uma vadia.

    Ainda sou capaz de sentir o cheiro nauseante do meu agressor. Está por toda parte. E então eu percebo que, mesmo se esse cara não existisse, mesmo se ele nunca tivesse cruzado o meu caminho, eu não estaria a salvo de ter sido destroçada e de ter tido a vagina arrebentada. Porque não foi só aquele cara que me estuprou. Foi uma cultura inteira.

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